Submeter-se a um tratamento oncológico é um momento delicado e que requer cuidados especiais, principalmente para quem deseja ter filhos biológicos no futuro. Um dos efeitos colaterais que podem surgir em razão da quimioterapia e da radioterapia é a diminuição no potencial reprodutivo que atinge tanto homens, quanto mulheres, causando infertilidade.
Em razão disso, uma paciente em tratamento contra o câncer ingressou com processo contra a sua operadora de plano de saúde, a fim de conseguir o custeio do congelamento de óvulos, como medida preventiva contra a infertilidade. A decisão unânime da 3ª Turma do STJ foi no sentido de que o plano de saúde deve cobrir os gastos da criopreservação, nome dado ao procedimento de congelamento de óvulos, até o final do tratamento de quimioterapia. Após a alta, porém, a paciente é quem deve arcar com os custos.
“O congelamento de óvulos custa, em média, R$ 20 mil; a fertilização in vitro [FIV] pode chegar a R$ 30 mil no Brasil. Nenhum deles é custeado por convênios médicos, já que a Lei dos Planos de Saúde desobriga operadoras e seguradoras a financiarem tratamentos do tipo. Essa decisão amplia o acesso à possibilidade de ter filhos biológicos por mulheres que lutam contra o câncer”, explica Aleksandra Jarocka, fundadora da Fertably, startup brasileira de cuidados médicos ligados à fertilidade.
O Tribunal entendeu que, neste caso, a criopreservação faz parte do planejamento familiar, que possui cobertura obrigatória pela Lei dos Planos de Saúde e, portanto, deveria ser custeado pela operadora do plano de saúde.
A relatora do caso no STJ, a ministra Nancy Andrighi, argumentou que, se a operadora cobre o procedimento de quimioterapia para tratar o câncer, deve fazê-lo também com relação à prevenção dos efeitos adversos da doença, como a infertilidade, de modo a possibilitar a plena reabilitação da beneficiária ao final do tratamento, quando então se considerará que o serviço foi devidamente prestado. Além disso, destacou, ainda, que o artigo 35-F da Lei 9.656/98 impõe às operadoras de planos de saúde a obrigação de prevenir doenças – como, no caso dos autos, a infertilidade, que consiste em dano previsível e evitável resultante do tratamento médico prescrito.
Apesar de louvável, esta decisão ainda não possui repercussão geral, ou seja, não será aplicada automaticamente para todos os outros casos, ficando os seus efeitos restritos ao caso específico dos autos. Entretanto, este entendimento possui grande peso e poderá ser usado para fundamentar diversas outras ações semelhantes, garantindo o direito à reprodução e ao planejamento familiar de milhares de mulheres em tratamento oncológico.
- Processo: REsp 1.962.984